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sonido nuevo y ondulante

La poesía puede devolvernos ciertos rituales que fueron reino, hace muchos siglos, de lo contemplativo que ahora, casi, agoniza. Me imagino a Ronald sentado a  la orilla del mar, fiel secretario de los rumores de toda esa inmensidad. Lleva el dictado con paciencia y luego escribe notas que pueden ser llevadas por los pájaros a los cuatro puntos cardinales.Sorbo el éter lluvioso,/endomingado de pasado. Me dice una de las aves que llega a posarse en mi ventana, frente a otra infinidad del mar.



Al leer estos sutiles textos no puedo dejar de recordar al poeta hondureño Nelson Merren en su poema Paisaje con un tronco podrido, y hago el silencio necesario para lograr la conjunción de estos poetas que dialogan desde distancias temporales lejanas y profundas.Cada vez que respira,/ el mar lo mueve un poco,/ lo tira más allá,/ luego lo trae,/ y lleva horas en esto.  Es lo que dice Nelson Merren para que Ronald Augusto le responda:


Vagas espurcas como um cuspo que retroagisse
às cercanias profundas, acaso indiferentes.               


Vagas y sórdidas como un escupitajo que devuelven
las cercanías profundas, acaso indiferentes.

Es como si, luego de leer lo que las aves trajeron, uno pudiera acercarse a las olas y pronunciar palabras que, al otro extremo, en otra orilla, un poeta recogiera con su sonido nuevo y ondulante, llenas de nuevos significados, de vida que renace desde el mar. [Fabricio Estrada]







Menear de árvores no quintal
vizinho.  
               A tarde rastela ramos,
mas é como se fizera um favor
convidando o vento a embaralhá-los.
Engelha o próprio engenho nesses galhos
que não quebra apesar de tanto esforço.
Dobra o nó da ramagem em noite prévia,
essa sombra que emerge do chão úmido.
Frescor que sabe à morte, sal.  
                                                       Fermentos,
friúme de ser craca e escara
na formosura desse arranca-tronco,
cujas raízes unham o vão profundo.

*

Sequer em meio à noite escura,
onde se apaga tudo a que me apego,
se cala o simulacro do espelho.
No salão vazio,
cerrado na moldura ovalada,
vislumbra-se, intermitente,
o braseiro de uma constelação,
remota a ponto de não discernir
os flagelos e as delícias dos homens.

*

No alívio da cozinha branca
(silêncio que não desaba),
graças ao pouco inox que contém,

enquanto o notebook,
numa espécie de crepitar minúsculo
resmunga durante o desligamento,

o sono se entranha e paralisa (metáfora-ademirdaguia
segundo a lâmina pernambucana) e
paralisa meus músculos.

*



O nervo surrado roça o flanco recurvo e enubla-se,
seu aceno corresponde a uma indagação.

Sorvo o éter chuvoso, endomingado
de tempo passado.

*

Esse timbre encardido do mar vazante,
                                                               anzolado.
Vagas espurcas como um cuspo que retroagisse
às cercanias profundas, acaso indiferentes.               



1
às vezes
a onda se forma
rasteira        como se
uma corda grossa
fosse
esticada de chofre




2
sorrateiro o montículo de areia desaba
tão logo vem a mosca pousar nele


3
ipásia em gamboa
a nuca e as ancas em meio à espuma

as ondas se dobram
reparo em seu rosto que vem à tona


4
reserve-se a soledade, coloque-a
de lado junto com tantos cuidados

a salsa ondina cinza ao pé da tarde
seguirá mordiscando calcanhares

mesmo que me abandonem esses cantares
tomados ao olvido que marulha,

a retro, infinidades de outros mares




Ronald Augusto (1961) é poeta, músico, ensaísta. As principais temáticas presentes em seu repertório intelectual referem-se à poesia contemporânea e à vertente negra na literatura brasileira. Atualmente Ronald Augusto realiza palestras e oficinas/cursos abordando assuntos como música, poéticas contemporâneas, literatura negra e poesia visual. Entre 2007 e 2012 manteve ao lado do poeta Ronaldo Machado a Editora Éblis, voltada para a poesia. De 2009 a 2013 foi editor associado do websiteWWW.sibila.com.br. Tem colaborações (resenhas e artigos de cultura e arte) nos cadernos Cultura do Diário Catarinense e do jornal Zero Hora. Publicou, entre outros, Homem ao Rubro (1983), Puya (1987),Kânhamo (1987), Vá de Valha (1992), Confissões Aplicadas (2004), No Assoalho Duro (2007), Cair de Costas(2012), Oliveira Silveira: poesia reunida (2012), Decupagens Assim (2012) e Empresto do Visitante (2013). Dá expediente no blog www.poesia-pau.blgspot.com  e é colunista do site http://www.sul21.com.br/jornal/

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