Skip to main content

ronaldo machado, excertos


Mais do que lance bem urdido de manipulação de linguagem, a palavra-montagem “solecidades”, que serve de título ao livro de estréia de Ronaldo Machado, aponta para a estrutural relação desse poema em parcelas do nosso século, com as falhas - no sentido de “fissuras” -, com os fragmentos e com as errâncias constitutivas das controversas personae poéticas do alto modernismo, localizadas no já recuado século passado.

O poeta faz o seu périplo através desses espaços de dissonância e sentido (ou de sua ausência), e sem desligar os pulsos da memória pessoal, mas num registro menos épico, focalizando a atenção nos arrabaldes e em suas “indecifráveis histórias” com um olhar lírico-imagético a percorrer estes “restos da cidade” transliterados a partir dos despojos discursivos de seus precursores. Entretanto, o leitor atento perceberá que Ronaldo lida menos com os topos do que com os tropos: “Na pedra/ palpita a pele abstrata da palavra:/ corpo estendido no vazio” (pág. 16). Em Solecidades, a cidade desmaterializa seu esqueleto feito de passagens, rede de textos-instalações. O poeta incorpora o tom crítico e a lucidez auto-irônica de uma linguagem que negocia e negaceia sua condição de texto relativizador - no sentido forte de pôr-se em relação.

Ronaldo Machado, através de Solecidades, promove uma interpretação contemporânea de certos dados do legado poético, seja recente, seja remoto, com a intenção de materializar, na vital volatilidade do aqui, esboços inventivos implicados numa tradição em processo.


(trechos do artigo "Através de Solecidades")

Comments

Cândido Rolim said…
e aí, malungos, como foi lá na palavraria?
abração
Cândido.

Popular posts from this blog

de lambuja, um poema traduzido

Ivy G. Wilson Ayo A. Coly Introduction Callaloo Volume 30, Number 2, Spring 2007 Special Issue: Callaloo and the Cultures and Letters of the Black Diaspora.To employ the term diaspora in black cultural studies now is equal parts imperative and elusive. In the wake of recent forceful critiques of nationalism, the diaspora has increasingly come to be understood as a concept—indeed, almost a discourse formation unto itself—that allows for, if not mandates, modes of analysis that are comparative, transnational, global in their perspective. And Callaloo, as a journal of African Diaspora arts and letters, might justly be understood to have a particular relationship to this mandate. For this special issue, we have tried to assemble pieces where the phrase diaspora can find little refuge as a self-reflexive term—a maneuver that seeks to destabilize the facile prefigurations of the word in our current critical vocabulary, where its invocation has too often become idiomatic. More critically, we

antipoema para a literatura branca brasileira

  por uma literatura de várzea por uma literatura lavada de notas de pé de página por uma literatura sem seguidores por uma literatura não endogâmica por uma literatura infiel à realidade por uma literatura impertinente por uma literatura não poética por uma literatura que não capitule à noção de "obra", acúmulo de feitos por uma literatura que não seja o corolário de oficinas de escrita criativa por uma literatura que não sucumba à chapa de que o menos é mais por uma literatura desobediente ao mercado livreiro-editorial por uma literatura imprudente por uma literatura sem cacoetes, isto é, o oposto do que faz mia couto por uma literatura que não se confunda com o ativismo de facebook por uma literatura que não seja imprescindível por uma literatura sem literatos por uma literatura, como disse uma vez lezama, livre dos tarados protetores das letras por uma literatura sem mediadores de leitura por uma literatura não inspirada em filósofos fr

nepotismo!

Amaralina Dinka, minha filha caçula de 11 anos, escreveu seu primeiro poema e me pediu para publicá-lo aqui no blog. Ela quer receber críticas e comentários. A MOCINHA FELIZ Eu acordei bem sapeca Parecendo uma peteca Fui direto pra cozinha Tomar meu café na caneca Na escola eu aprendi A multiplicar No recreio fui brincar Cheguei em casa Subi a escada Escorreguei, Caí no chão Mas não chorei Na hora de jantar Tomei meu chá Na minha janela Vi uma mulher tagarela.