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Showing posts from May, 2006

diz bem mesmo quando maldiz

Paulo de Toledo entrevista Ronald Augusto Para que serve a poesia? Esta pergunta me traz à memória o poema “O porto sepulto”, de Giuseppe Ungaretti, do qual destaco o seguinte trecho: “Di questa poesia / mi resta / quel nulla / d'inesauribile segreto”, que me permito tresler assim: poesia, essa coisa nenhuma de inexaurível segredo. A poesia não serve para coisa alguma, nem se presta à transmissão de mensagens. Seu fazer parece querer ficar rente àquelas zonas mais obscuras e imprecisas da experiência. Seu movimento sígnico, em realidade, busca não dissimular, mas sim problematizar, um aspecto crítico da linguagem, ao qual não se dá a devida atenção, a saber: esta crença infundada de que só a linguagem articulada e seu corolário, uma objetividade desinteressada e quase transparente, é capaz de iluminar e decodificar o íntimo dos seres e das coisas. Na prática, o resultado é bem outro. Tal pretensão de desvelamento acaba, ao contrário, projetando sombras de sentido e mal entendidos e

Wu t’i

duro assistir a movimentos que não os dela imaginá-los nem pensar uma flor que cai no ombro do vento a larva da seda desentranha-se fio a fio fria artefinalização drapeja o lume em gotas ascendentes coração encarvoado fluido no olho do espelho o error nuvem borrando o tempo noite de palavras secretadas a lua rola ao seu degelo parece distante o Morro do Engenho Velho no céu uma ave aparece medito digo-me: ainda não mandei notícias maio, 1991

ao 13 de maio

xenófanes de colofão 570-528, a. c. tapeçarias VII, 2 egípicios: deuses abanam narizes chatos e são negros de pêlo duro trácios: divergindo deles sustentamos que deuses têm olhos verdes e cabelo ruivo * virgílio 70-19, a. c. fragmento da II bucólica o crudelis alexi, nihil mea carmina curas? menalcan, quamuis ille niger, quamuis tu candidus esses? pois, cruel aléxis, menalcas é negro, e agora? considera isto, rapaz formalista, não te escores muito nas cores. o formose puer, nimium ne crede colori! alba ligustra cadunt, vaccinia nigra leguntur. belas madeixas, pétalas alvas, no que grisalhas, caem adubando o jardim retinto dos jacintos.

poema de salvador com pintura de rosa marques

sonhei comigo sonho sob pórticos de luz tropical claridade verde que eu julgava ser o espelho onde esta face (agora inclinada sobre linhas toscas de recordação puramente imaginária) espelho onde esta face pudesse mirar-se com minuciosa veracidade sonho de vaidade vácua que paraíso guardará a menor semelhança que seja com a cara inexistente que às vezes afivelo sobre a face para melhor me desvelar?
Cientes del mundo Ronald Augusto (tradução Ines Hagemeyer) escarnio de moneda jugada forjada de manera siniestra a lo filósofo eminente y a lo poeta sobre todo que ni por ruego ni por cobicia dejan de hacer justicia si dejaran un dia de hacerla palmo a palmo se alejaría de ellos de tal suerte que en el campo adversario no harán de tolerante pero en casa presionando el acelerador (terreno escabroso) terminarán con sus patas flotando ambos sosteniendo el pretexto de ser el primero en forjar su modelo antes que el outro la “piedra de toque” : pagar con la misma moneda en cuanto a mí me arreglo con menos voy girando la misma moneda y ésto equivale a decir maldiciendo: el lado necio es el docto y vice versa
jejum ergo coroa destronante jejum disse jesucristo enquanto levava à testa renhidos picos cesto vazio seco o pão ázimo nem azia nem pedrarias beco básico câmara contraespiã movediça e especular desdobrando braços no mais íntimo do palácio elísio de kublai khan

um poema cheio de dedos

que deus em sua teia viúva a tenha aquela época clara em que cabra seco carne branca de peixe convertia a duras penas etíope em mussum músculos música tirando proveito da cena circundante enquanto revirava algo como o monturo da metáfora o kitsch da função poética da linguagem e para não entrar em atrito com o que regrava a letra homens de letras rascunhavam seus poemas nodosos reservando em alguns instantes dessas obras abertas (alavancas armadas da impureza rarefeita) um lugar legal ao corso negro uma fossa de onde negros após entrados saíam asperamente apetrechados assim sendo eu por exemplo concordante com o que à época vigia viria a público como aquele negro urubu de fraque uma negra cabelo adelgaçado a fogo (apara do estupro escravagista) por sua vez sem réstia de dúvida consistiria um destaque libação libidinosa a escorrer sobre toda a audiência ovacionando sem pudores de pé a entrada da mulata carnuda adoração odorante mas aos poucos outros vieram erupções em solo estéril l