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festival de arte negra



Quando o mundo branco se põe a fazer elogios desmedidos a respeito do trabalho ou da personalidade de um negro, sempre me preparo para o pior. Por favor, não me venham falar em baixa estima, que estou na defensiva e tudo mais. O furo aqui é bem mais embaixo. Segundo Friedrich Nietzsche “o comentário demasiadamente elogioso produz mais indiscrições que a censura”. As louvações, neste caso, têm fundo culposo; se efetivam sem que possamos lhes prever as conseqüências. Desvelam a imprudente face do preconceito. Para compensar toda uma série de episódios aniquiladores do ânimo de muitas personalidades negras fundamentais para a nossa cultura, o senso comum carrega nas tintas da apologia purgativa sobre aqueles que parecem ter vivido vidas que poderiam ter sido, mas que não foram. Parodiando o adágio relativo à vingança, pode-se dizer que tal espécie de elogio é um prato que se oferece frio ao seu maior interessado. Por essa razão, Cruz e Sousa é o Dante negro; Leônidas da Silva, o Diamante Negro, Elizeth é a Divina, e assim por diante.

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